Tuesday, May 23, 2006

Les femmes qui lisent sont dangereuses



Era o final da tarde. Setembro, ainda sem as folhas vermelhas de quando o Outono torna o entardecer mais frio.Ela estava sentada na varanda, na sua cadeira favorita, a ler um livro de páginas iluminadas pela história de um homem que acabaria junto a um lago num dia de vento.Baloiçava, muito devagar, a perna direita, enquanto, com a mão esquerda, entre o voltar silencioso de cada folha, percorria distraídamente, umas vezes, a curva do joelho, outras, a linha do pescoço.Ele observava-a, sem saber se ela o sabia.Ele conhecia a história que ela agora descobria.Ele sabia que chegaria um momento no qual, enfeitiçada pela viagem de uma chávena de chá tocada por diferentes lábios, ela susteria a respiração por um momento tão pequeno que nem ela própria se aperceberia, e que nesse momento, tão fugaz que ele não o conseguiria ver, tudo à sua volta, o canto dos pássaros, o silêncio do jardim, o azul do céu, se confundiria no sorriso bonito que ela não chegaria a esboçar.Nesse momento, talvez ele pudesse ter-se acercado dela tomando o livro nas suas mãos, primeiro, e, depois, tranquilizando-a com a sua voz, lendo, só para ela o capítulo seguinte da história.Ela fecharia os olhos e ele continuaria a ler, já sem olhar o livro, contando de memória a história da rapariguinha de quimono vermelho e olhos fechados, os olhos que o homem que acabaria junto a um lago num dia de vento ainda não vira, enquanto o seu próprio olhar se perderia no ondular quente da pele dela acariciada pela última luz.Mas quando esse momento chegou, quando no rosto dela houve o quase esboçar de um sorriso imperceptível, um arrepio inesperado que atribuiu à brisa que não se ouvia, ele apenas procurou uma última vez o seu olhar, sabendo de antemão que não o encontraria, e, depois, silenciosamente, retirou-se, sem coragem para dizer nem que fosse o príncipio de uma palavra que pudesse estragar a perfeição daquele final de tarde.

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