Conheciam-se há anos mas queriam-se há muito mais tempo. Desde que se conheceram ou, talvez, até antes. Um dia, rectius, uma noite, fruto de alguns acasos e muitas vontades, deram por si num quarto de hotel em Bruxelas. Ele odiava a cidade, viera em trabalho. Ela quase tanto, estava por lá há meses num curso de dança. Cansado, ele, cheia de nódoas negras, ela. Estão ambos sentados, ele na beira da cama, ela na beira da única cadeira. Evitam olhar-se, primeiro, olham-se de soslaio, depois, entreolham-se, desconcertados, em seguida, olham-se, desconcentrados, por fim. Pelo canto do olho, ele. Olhos nos olhos, ela. Sabem que nunca estiveram tão perto. A não ser talvez naquele dia, rectius, naquele final de tarde, junto ao rio, quando os lábios dela se despediram no ombro dele. Mas isso foi há tanto tempo. Num canto do quarto há uma miniatura de Tintin, apressado, Milou aos pinchos. Ela olha para os bonecos e sorri. Ele respira fundo como costuma fazer por quase tudo (e quase nada) e sorri. Levantam-se, ao mesmo tempo. De um salto. Como dançarinos. A presença da cama, fofa e imaculada, ensurdece-os. Nenhum olha para trás. Só voltam a falar depois da primeira cerveja no café na esquina da Grand Place. A noite corre, longa, terna e quente. Na próxima semana, no dia dos anos dela, ele voltará a Bruxelas. Ela não estará lá.